Na oficina dos sons: Mário Estanislau e o renascimento da gaita-de-foles

Mário Estanislau | Luthier | 2025

No coração da Maceira, entre colinas discretas e a memória de um país sonoro, encontramos Mário Estanislau — construtor de instrumentos, artesão do tempo e da matéria. Nesta entrevista em vídeo, mergulhamos na sua oficina, onde a madeira, o couro e o sopro se unem para fazer renascer sons ancestrais: guitarras campaniças, guitarras portuguesas e, acima de tudo, a gaita-de-foles.

Mário Estanislau começou a construir instrumentos por necessidade e curiosidade: com apenas 14 anos, fez às escondidas a sua primeira guitarra. Mais tarde, já com formação em mecânica e domínio de técnicas de torno, o seu interesse concentrou-se na construção de gaitas, num contexto em que este instrumento tradicional se encontrava em vias de desaparecimento em Portugal.

Corpos de gaitas-de-foles aguardam montagem na oficina de Mário Estanislau.

“Nos finais dos anos 90 já havia um défice enorme de gaiteiros no país”

Foi nesse período que conheceu a Associação Gaita de Foles e iniciou uma longa colaboração com Vítor Félix, também construtor e músico. Juntos, partilharam saberes, viajaram à Galiza para aprender com mestres galegos e formaram uma parceria que dura até hoje. Esta troca de experiências não só fortaleceu o seu trabalho como permitiu a consolidação de um movimento de recuperação e revalorização da gaita-de-foles em território nacional.

Torno mecânico utilizado na construção de gaitas-de-foles. As madeiras alinhadas à direita revelam a diversidade de espécies e sonoridades trabalhadas na oficina.

A oficina de Mário é hoje espaço de construção, reparação, transmissão e partilha. As encomendas que recebe são geralmente personalizadas e vão de gaitas de foles a guitarras portuguesas, passando por oboés e sanfonas.

Os preços das gaitas-de-foles oscilam entre os 700 € e os 1300 €, dependendo do modelo e da complexidade da encomenda.

Quem desejar aprender a tocar pode também ter aulas em Torres Vedras ou na própria Maceira, numa lógica de ensino comunitário e próximo.

Conjunto de formões de precisão usados no acabamento das peças em madeira. Ferramentas essenciais na construção artesanal de instrumentos musicais.

Ao longo da conversa, Mário aborda ainda as origens da gaita-de-foles — um instrumento ligado à pastorícia e presente em múltiplas culturas — bem como a evolução técnica das gaitas, presente em versões electrónicas com sensores de pressão e amplificação. Destaca também o papel de festivais como o Intercéltico de Sendim e de grupos como os Galandum Galundaina no estímulo ao interesse por este património sonoro.

Gavetão com componentes de gaitas-de-foles em diferentes fases de construção. A cor e a textura das peças revelam o cuidado artesanal na escolha e tratamento da madeira.

Este vídeo é um retrato vivo de uma vocação rara e de um movimento que devolve dignidade e presença a instrumentos e tradições que quase se perderam. Na oficina dos sons, como lhe chamamos, Mário Estanislau constrói, repara e resiste — e com ele, a gaita-de-foles portuguesa volta a respirar.

Mais informações em: www.sonsdamusica.pt